A palavra “louco” ou “loucura” sempre chega como uma sombra mal interpretada. Sempre que nos deparamos com algo diferente — seja vendo, sentindo ou participando — há olhos prontos a nos rotular: “isso é loucura”. Mas loucura não é diferença. Loucura não é singularidade. Loucura, muitas vezes, é apenas o medo do outro, do que foge do padrão, do que escapa ao roteiro que a sociedade insiste em escrever.
As pessoas têm mania de rotular o diferente. Acham estranho, brega, cafona, anormal. São palavras frias, julgamentos que se travestem de senso comum. Alguns dizem não ser conservadores, mas suas reações mostram que não estão aptos a aceitar costumes, modas ou tradições do passado. Um neo-conservadorismo disfarçado, que subjuga o conservadorismo antigo e sufoca a diferença.
Digo isso porque nem sempre me sinto igual aos outros. Quero vestir algo diferente, falar algo diferente, e isso não deveria ser chamado de loucura. Uma camisa sem gola, uma gravata borboleta — são pequenos gestos de ousadia, cores em um mundo de tons neutros. E, ainda assim, há olhares que nos transformam em E.T.s, em seres de outro planeta, seres que caminham fora do tempo.
Imagine a cena: eu, em uma repartição pública, usando uma gravata borboleta azul como céu de verão, e todos me olhando como se fosse um erro da natureza. Ou pior, um terno rosa choque sob o sol ardente do Centro-Oeste brasileiro — seria uma tempestade de olhares, cochichos e dedos apontando. E tudo por um pedaço de tecido. A gravata borboleta, no entanto, é apenas poesia, um fio de diferença que não fere ninguém.
Na Europa e na África, vejo outro filme: cores, tradições, singularidades dançam juntas sem medo. No Brasil, ainda nos prendemos a paletós em dias escaldantes, esquecendo que o corpo transpira, que a alma pede liberdade. Deveríamos vestir vestidos africanos, cores que contam histórias, que atravessam gerações e respeitam o calor do nosso chão. Não é loucura, é vida.
Não estou revoltado; apenas penso. Loucura verdadeira é doença, patologia que precisa de cuidado. Diferença é vento, é chuva, é sol que colore a existência. Mas estamos cercados de preconceitos. A não aceitação do outro gera guerras silenciosas, pequenas e grandes, nas ruas, nas escolas, nas famílias. A diferença é nossa riqueza; a desigualdade, sim, é o inimigo.
Imagine ir à Ilha de Páscoa e ver tudo igual a Brasília, ou viajar ao Butão e encontrar uma lanchonete da Asa Sul. Que tédio, que vazio! Precisamos de reflexão, de diferença, de aceitação. Se cultivássemos isso, metade dos problemas — bullying, discussões, vergonha — se dissiparia como fumaça ao vento. Já estaríamos em metade do caminho da mudança que Platão imaginou.
Dentro de mim, ideias e pensamentos surgem como ondas em um oceano tempestuoso. Tentam escapar, se perder, desaparecer. Tento capturá-los, mas alguns se vão, como estrelas que se apagam antes do amanhecer. Talvez, em outra vida, poderei agarrá-los por completo. Assim como Ludwig Wittgenstein, busco o isolamento não para me calar, mas para permitir que minhas ondas internas cheguem à luz.
“Tenho a impressão de ter conseguido trazer à luz as ondas de pensamento que estavam confinadas dentro de mim.”
Se algum dia eu conseguir, se essas ondas, esses pensamentos, forem finalmente visíveis, compreendidos, então estarei metade realizado. Metade de um sonho que é, na verdade, a busca eterna pela diferença, pela liberdade e pela beleza da loucura que todos nós carregamos.
Um comentário:
"Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é, ainda vai nos levar além". Paulo Leminski.
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